CHAMADA DE TRABALHOS – EDIÇÃO ESPECIAL – Liderança: revisitando as grandes questões da teoria e da prática
Embora os estudos sobre liderança remontem aos primórdios da administração como ciência social aplicada, nos últimos 30 anos, em especial a partir dos anos 2000, a pesquisa sobre o tema cresceu muito (Carton, 2021; Day, Riggio, Tan, & Conger, 2021; Gardner et al., 2020).
Embora os estudos sobre liderança remontem aos primórdios da administração como ciência social aplicada, nos últimos 30 anos, em especial a partir dos anos 2000, a pesquisa sobre o tema cresceu muito (Carton, 2021; Day, Riggio, Tan, & Conger, 2021; Gardner et al., 2020). Em essência, liderar envolve direcionar, alinhar e mobilizar pessoas (Kotter, 2001). Liderança é especialmente importante quando grupos, organizações e sociedades precisam lidar com desafios adaptativos (Heifetz, Grashow, & Linsky, 2009). Nas últimas décadas, novos paradigmas, teorias e visões sobre o fenômeno da liderança se desenvolveram, passando de uma perspectiva que se concentra na figura do líder — seus traços, estilos e comportamentos — para um fenômeno mais dinâmico, relacional, compartilhado, que envolve diferentes mecanismos e loci de liderança (Hernandez, Eberly, Avolio, & Johnson, 2008).
Mesmo, no entanto, que os avanços teóricos e o aumento da diversidade de teorias tenham ajudado a fortalecer o campo e a ampliar sua abrangência na conexão com a prática, diversos desafios acompanham o crescimento dessas novas perspectivas. Além disso, apesar de todo o desenvolvimento teórico e metodológico em liderança nos últimos anos — explorando microprocessos, como percepções, emoções e cognições (Dinh & Lord, 2012); macroprocessos, como o contexto sociorrelacional (DeRue & Ashford, 2010); ou como a liderança se manifesta em sistemas complexos e em redes sociais dinâmicas (Uhl-Bien & Marion, 2009) —, grande parte dos estudos gira em torno de conceituações limitadas do fenômeno (Carton, 2021).
Nesta chamada especial para artigos, esperamos contribuir para um avanço teórico e empírico no campo da liderança, tendo como ponto de partida o interesse na compreensão de como a teoria e a prática da liderança podem contribuir para um melhor entendimento dos processos e de seus vários elementos — antecedentes, consequências, mecanismos ou mesmo singularidades — e de como afetam os resultados concernentes a líderes, seguidores, relações, grupos e contexto organizacional. Ou seja, torna-se mais importante dar atenção diferenciada a tais processos e elementos dentro do fenômeno da liderança, uma vez que a maioria das pesquisas, em especial no contexto brasileiro, tem se concentrado com mais frequência numa visão baseada em competências, estilos ou comportamentos da liderança, fundamentando-se predominantemente em métodos de pesquisa transversais (Gardner, Lowe, Moss, Mahoney, & Cogliser, 2010).
Esta chamada tem especial interesse em artigos que explorem o fenômeno da liderança com relevância direta para a prática organizacional, que considerem níveis de análise para além do líder, que envolvam fatores contingenciais, contextuais ou processuais, e, por fim, que reflitam ou extrapolem o mainstream dos estudos sobre o tema.
Os tópicos a seguir são indicativos, mas não exaustivos, de áreas temáticas que podem ser abordadas.
1)Como o “novo mundo do trabalho” — num contexto de pós-pandemia de COVID-19, recessão econômica, incerteza, formas de trabalho flexíveis, equipes virtuais, carreiras sem limites, novas carreiras e profissões — influencia a liderança? Como a pesquisa de liderança deve evoluir para acompanhar novas formas e contexto do trabalho?
2)Como teorias e abordagens epistemológicas de outras disciplinas — como fenomenologia, construtivismo social, filosofia relacional, perspectivas psicanalíticas etc. — podem contribuir para a compreensão do fenômeno da liderança?
3)Como a tecnologia e a virtualidade impactam as ações dos líderes e a liderança de forma geral? Em que medida elas podem forçar a necessidade de reconsiderar as teorias de liderança? Quais das teorias existentes de liderança funcionam melhor nos regimes presenciais versus remoto?
4)De que forma as diferentes teorias e perspectivas sobre liderança podem ser integradas e contrastadas?
5)Quais são os antecedentes e as consequências de abordagens mais recentes de liderança — por exemplo, coletivas, compartilhadas, inclusivas, humildes?
6)Como o contexto cultural nacional molda o conteúdo e a estrutura da liderança? Como expatriados desenvolvem suas práticas de liderança em outras culturas?
7)Quais são as implicações das questões de raça, gênero e identidade no exercício da liderança?
8)Como contextos específicos organizacionais — administração pública, organizações sem fins lucrativos, organizações militares, educação — moldam o fenômeno da liderança?
9)Como a análise de redes sociais pode ampliar o domínio da pesquisa em liderança?
10)Quais são os potenciais “lados sombrios” da liderança?
11)Quais são os principais desafios da liderança? O que os líderes têm a dizer sobre isso?
12)Quais são os antecedentes e as implicações do processo de desenvolvimento da liderança em ambientes organizacionais?
13)Qual é o papel e a importância da liderança diante dos desafios éticos e de justiça social que se apresentam na atualidade?
14)Como o uso de medidas psicométricas objetivas — psicofisiológicas, objetivas de desempenho etc. — podem contribuir para a compreensão do fenômeno da liderança?
15)Quais são as limitações de teorias e estudos sobre liderança existentes e quais são os passos necessários para que essas teorias e estudos tenham maior relevância e aplicabilidade?
Para além dos tópicos elencados, contribuições originais que desenvolvam ou testem a teoria e/ou o pensamento teórico sobre abordagens mais clássicas em liderança são bem-vindas. Artigos que desafiem o status quo e ofereçam novas abordagens para velhas formas de pensar ou que proponham formas inovadoras de pensar a liderança são encorajados. Particularmente relevantes são estudos que desafiem abordagens bem estabelecidas no campo, como teorias clássicas e cotingenciais.
Gostaríamos de enfatizar que, para além dos tópicos especificados, são bem-vindos artigos teóricos, metodológicos e empíricos que empreguem métodos quantitativos ou qualitativos rigorosos, com coleta e análise de dados apropriadas. Para os estudos quantitativos, especial atenção deve ser dada aos problemas de viés de método comum, utilizando-se medidas para mitigá-los (Podsakoff, MacKenzie, Lee, & Podsakoff, 2003).
Os editores desta edição especial são Juliana Mansur (FGV EBAPE), Gustavo Tavares (Insper), Urszula Lagowska (Neoma Business School) e Liliane Furtado (Coppead UFRJ). Perguntas sobre tópicos de interesse ou esclarecimentos podem ser direcionados a juliana.mansur@fgv.br.
O prazo para a submissão de manuscritos é 1 de agosto de 2022. Publicar a edição especial em 2023.
REFERÊNCIAS
Carton, A. M. (2022, January). The Science of Leadership: A Theoretical Model and Research Agenda. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, 9. Recuperado de https://doi.org/10.1146/annurev-orgpsych-012420-091227
Day, D. V., Riggio, R. E., Tan, S. J., & Conger, J. A. (2021, October). Advancing the science of 21st-century leadership development: Theory, research, and practice. The Leadership Quarterly, 31(5), 101557.
DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. Academy of Management Review, 35(4), 627-647.
Dinh, J. E., & Lord, R. G. (2012). Implications of dispositional and process views of traits for individual difference research in leadership. The Leadership Quarterly, 23(4), 651-669.
Gardner, W. L., Lowe, K. B., Meuser, J. D., Noghani, F., Gullifor, D. P., & Cogliser, C. C. (2020). The leadership trilogy: A review of the third decade of the leadership quarterly. The Leadership Quarterly, 31(1), 101379.
Gardner, W. L., Lowe, K. B., Moss, T. W., Mahoney, K. T., & Cogliser, C. C. (2010, December). Scholarly leadership of the study of leadership: A review of The Leadership Quarterly’s second decade, 2000-2009. The Leadership Quarterly, 21(6), 922-958.
Heifetz, R., Grashow, A., & Linsky, M. (2009). The practice of adaptive leadership: Tools and tactics for changing your organization and the world. Boston, MA: Harvard Business Publishing.
Hernandez, M., Eberly, M. B., Avolio, B. J., & Johnson, M. D. (2011). The loci and mechanisms of leadership: Exploring a more comprehensive view of leadership theory. The Leadership Quarterly, 22(6), 1165-1185.
Kotter, J. P. (2001). What leaders really do. Harvard Business Review, 79(11). Recuperado de https://hbr.org/2001/12/what-leaders-really-do
Podsakoff, P. M., MacKenzie, S. B., Lee, J. Y., & Podsakoff, N. P. (2003). Common method biases in behavioral research: a critical review of the literature and recommended remedies. Journal of applied psychology, 88(5), 879.
Uhl-Bien, M., & Marion, R. (2009). Complexity leadership in bureaucratic forms of organizing: A meso model. The Leadership Quarterly, 20(4), 631-650.
O Cadernos EBAPE.BR é um periódico online na área de administração publicado no Rio de Janeiro, Brasil, pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV EBAPE) e de acesso aberto.
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